Luiz Lobão e Áureo Petita
Abril de 1976. Fazia dez anos que o time do Maués não ganhava do time do Náutico em partidas oficiais pelo campeonato amador, quando Áureo Petita e Luiz Lobão vestiram pela primeira vez a camisa do clube da Cachoeirinha, na época dirigido pelo técnico Luiz Calango.
Jogando ao lado de Gilberto, Ernâni, Vivaldo, Erasmo, Mário Rato e Alcides, os dois ex-craques do Murrinhas do Egito fizeram uma exibição de gala e o Maués enfiou 4 a zero no Náutico, com três gols de Luiz Lobão e um de Áureo Petita, depois de driblar a zaga inteira da equipe adversária.
Assim
que o jogo terminou, João Zaranza, dono do Náutico, chamou Luiz Lobão e Áureo
Petita para uma conversa reservada. Se os dois topassem jogar pelo seu time,
ele empregaria ambos na Fogás, onde exercia o cargo de gerente da Manutenção.
Os dois toparam.
Luiz
Lobão foi trabalhar como estoquista e Áureo, como frentista da bomba de
gasolina dos veículos da manutenção. Puto da vida, o técnico do Maués, Luiz
Calango, passou uma semana inteira andando pelo bairro disposto a enfiar uma
peixeira cega no bucho dos dois “traíras”.
Na
véspera do jogo de estreia dos novos reforços do time, João Zaranza chamou Luiz
Lobão e Áureo Petita para uma nova conversa reservada. Os dois teriam de
participar de uma sessão de descarrego no Centro de Umbanda Caboco Sete Flexas,
em Petropólis, que tinha como babalorixá um outro funcionário da Fogás, João da
Mata, empregado de João Zaranza e um dos mais fiéis torcedores do Náutico. Os
dois toparam.
A
pajelança transcorreu normalmente. Áureo Petita e Luiz Lobão ficaram apenas de
cueca em um círculo de pólvora, próximo do congá. Depois de uma sequência de
cânticos, o babalorixá João da Mata incorporou o exu Tranca Ruas, que retirou
sete moedas de um alguidar e passou as moedas pelo corpo dos atletas.
Depois,
de um segundo alguidar, Tranca Ruas retirou uma mistura de mel de abelha,
azeite de dendê e gergelim e “engraxou” os pés dos atletas. Finalmente, Tranca
Ruas colocou fogo na pólvora e, enquanto recitava um “ponto”, despejou sobre a
cabeça dos dois atletas uma cuia contendo “banho de cheiro”, à base de
alfazema, erva doce e manjericão. Feito isso, Tranca Ruas foi embora.
Na
sequência, o babalorixá João da Mata deu um toque para João Zaranza, única
testemunha ocular da sessão de descarrego, sem esconder a sensação de dever
cumprido:
– Pronto,
meu padrinho, tá tudo amarrado! Tá tudo amarrado! Só vai dar nóis!
João
Zaranza se despediu do babalorixá, colocou os dois atletas no seu carro e foi
deixa-los em casa.
No
dia seguinte, durante o jogo de estreia dos novos reforços, nada parecia dar
certo. Luiz Lobão perdeu quatro gols cara a cara com o goleiro, chutando a bola
bisonhamente pra fora. Áureo Petita não conseguia dar um único drible, que
tropeçava na bola e desabava de cara no chão. Não conseguiu fazer um lançamento
decente nem se manter em pé em campo por mais de cinco minutos. Um vexame. O
Náutico perdeu de 1 a zero. Puto da vida, João Zaranza foi tomar satisfações
com o babalorixá:
– Que
porra de feitiço foi aquele, João da Mata, que porra de feitiço foi aquele? O
Áureo Petita e o Luiz Lobão apanharam da bola o tempo todo...
–
Ué? Eles não são os fodões da Vila Mamão do time do Maués?... – reagiu o
babalorixá. – Pois, o exu Tranca Ruas amarrou eles com um nó-de-cachorro da
gota serena, que nunca mais aquelas duas pestes vão fazer porra nenhuma dentro
de campo...
Foi
um parto para João Zaranza desfazer o equívoco. Luiz Lobão e Áureo Petita
tiveram que ser conduzidos às pressas para uma nova sessão de descarrego, a fim
de reverter a pajelança anterior. Deu certo. Naquele ano, o Náutico se sagrou
campeão, Luiz Lobão foi o artilheiro da competição com 27 gols e Áureo Petita
foi eleito o craque do ano. O babalorixá João da Mata era danado.
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